LE ORME - COLLAGE (1971)








Collage
é o segundo álbum de estúdio da banda italiana Le Orme. Seu
lançamento oficial aconteceu em 1971, mesmo ano em que foi gravado,
em Milão na Itália. O selo responsável foi o Phillips e a produção
ficou por conta de Gian Piero Reverberi.







O
RAC traz, pela primeira vez em suas páginas, o
tão famoso Rock Progressivo italiano, com o álbum Collage,
da banda Le Orme. Depois da tradicional contextualização,
abranger-se-á o faixa a faixa.










Origens





O
primeiro núcleo do grupo foi formado em Marghera, um subúrbio
industrial de Veneza, por iniciativa do guitarrista veneziano Nino
Smeraldi e de Aldo Tagliapietra, então com 21 anos, que havia sido o
vencedor de uma competição para jovens compositores e estava
insatisfeito com o conjunto com o qual tocava, o Corals, uma banda
cover típica do final dos anos sessenta.






Junto
ao baixista Claudio Galieti e ao baterista Marino Rebeschini, foi
fundado o Le Orme.





O
primeiro núcleo optou inicialmente por se chamar ‘Le Ombre’, em
homenagem à banda inglesa The Shadows, uma paixão em comum
do quarteto, mas, segundo a versão oficial, os quatro optaram por Le
Orme
, para evitar duplos significados irônicos, pois, na língua
veneziana, também significa ‘copo de vinho’ (de n'ombra de
vin
veneziano, ou seja, um copo de vinho).





Além
disso, naquele tempo, um grupo emergente com esse nome (Le Ombre) já
existia no Veneto.





Primeiras
gravações





Rejeitada
pela gravadora Emi, pela qual fez um teste, essa primeira formação
gravou um único single, “Fiori e colori” (1967), produzido por
Tony Tasinato, pelo selo CAR Juke Box, do maestro italiano Carlo
Alberto Rossi.






O
single, de acordo com a moda daquela época, também foi gravado em
inglês com o título “Flowers and Colors”.





Apenas
um dia após a publicação, o baterista Marino Rebeschini desistiu
de tocar com o grupo para cumprir seus deveres militares e foi
substituído por Michi Dei Rossi, do grupo Hopopi, na época a banda
líder na cena veneziana que acabara de participar do evento
Liverpool Beat Festival, a convite dos espanhóis do Los Bravos.





Em
1968, o Le Orme ganhou uma certa fama, graças a suas apresentações
ao vivo no então famoso restaurante Piper, em Roma.





O
conjunto gravou um novo single, “Senti l'estate che torna”. Com
esta peça, também publicada em inglês com o título “Summer
Comin'”, ele participou da competição Un disco per
l'estate
: para essa participação, foi contratado um novo
músico, o tecladista Tony Pagliuca , fundador do Hopopi, então
recentemente dissolvido.





No
final do mesmo ano, os cinco entraram no estúdio de gravação para
gravar seu primeiro álbum, Ad gloriam. Como dizia o título,
o disco foi registrado apenas ‘para a glória’, pois os cinco
sabiam que a operação era arriscada e que o trabalho teria tido
pouco sucesso comercial, como de fato aconteceu, e isso causou a fim
das relações com o selo CAR Juke Box.







Tony Pagliuca





Mais
mudanças





Em
1969, o baixista Galieti foi forçado a abandonar o grupo por causa
do serviço militar, e Tagliapietra foi quem o substituiu na função.
Dei Rossi, também chamado às armas, permaneceu tocando de qualquer
maneira, sendo substituído por um curto período por Dave Baker,
inglês, com quem a banda gravou o single “Irene” (também
publicado em inglês com o título “She lives for today”) e mais
duas faixas, que deveriam ter permanecido apenas como audições, uma
breve proposta do “Concerto de Brandenburgo n.3”, de Johann
Sebastian Bach
, e “Blue Rondò à la Turk”, clássico de Dave
Brubeck
.





A
gravação deste single representou, de fato, a gênese do rock
progressivo italiano, mas só foi publicada em 1973, pois, em 1969,
não era considerada adequada para o público local.





Essas
duas peças também marcaram o avanço musical do grupo, abandonando
assim as notas fáceis do estilo Beat, base de Ad gloriam,
para sempre.





Consolidação





Naquela
época, o grupo gravou e publicou outros singles, reunidos em
L'aurora delle Orme, uma espécie de compilação que, lançada
sem a autorização do grupo, logo foi retirada do mercado: seria
republicada apenas muitos anos depois.





As
diferenças de opinião entre Pagliuca, que queria focar o som da
banda no teclado, e Smeraldi, que preferia que o conjunto se
concentrasse em sua guitarra solo, foram as causas da saída deste
último.





Smeraldi
não foi substituído e, portanto, o grupo rapidamente se viu de um
quinteto a um trio, naquela que é geralmente identificada como sua
‘formação clássica’: Tagliapietra no baixo, guitarra e vocais,
Pagliuca no teclado e Dei Rossi na bateria.





Após
a saída de Smeraldi, Pagliuca é o primeiro dos músicos italianos a
inferir que a música beat já está saindo de cena e que o novo pop
sinfônico, vindo do Reino Unido, em breve seria um sucesso também
na Itália.





Pagliuca
confirmaria isso em sua primeira viagem a Londres, onde conhece
Armando Gallo, jornalista-fotógrafo da revista especializada Ciao
2001, que o apresenta não somente a uma Londres pós-Beatles,
mas também a grupos como Quatermass, The Nice, Yes
e Emerson, Lake & Palmer.






De
volta a Veneza, ele convence seus companheiros de Le Orme
(Aldo Tagliapietra e Michi dei Rossi) a experimentarem e a desenvolverem novas linguagens musicais. Nasce também uma viagem à Ilha de Wight,
para vivenciarem a nova onda de rock no Festival de 1970.







Aldo Tagliapietra





Collage





O
trio mudou de gravadora, passando primeiro pela Telegram (subsidiária
da Phonogram) e depois ficou na Philips Records, com a qual lançou
o single “Il profumo delle viole” e, em 1971, o álbum Collage.





O
registro aborda temas muito atuais (como prostituição em “Era
inverno”). Apesar da profunda tristeza das letras, destaca-se o
esforço criativo do grupo em busca de novos estilos: acima de tudo,
destaca-se a intenção de se afastar dos esquemas padrões, sem
renunciá-los.





O
vínculo com a música clássica é de fundamental importância,
tanto que a peça de abertura, “Collage”, contém uma seção de
cravo retirada da famosa sonata K 380, de Domenico Scarlatti.





Destaca-se
também a peça “Cemento armato”, uma tentaiva à beira do rock
experimental e “Evasione totale” e “Immagini”, composições
sutilmente influenciadas pelo rock psicodélico que caracterizou o
início do conjunto.





Vamos
às faixas:





COLLAGE





"Collage" é a abertura totalmente instrumental do disco e uma pequena amostra do que está por vir. Os teclados de Tony Pagliuca são a força dominante da composição, em uma clara referência ao ELP. Ótima música.













ERA
INVERNO





"Era Inverno" é mais convencional, em uma abordagem Rock, com influência Pop, em uma melodia suave e, ao mesmo tempo, tocante. Ótimos vocais de Tagliapietra e bom trabalho do baterista Dei Rossi.





A
letra fala sobre uma prostituta:





Un'
attrice che non cambia scena


Diecimila,
ventimila,


Nelle
mani del cliente


Che
possiede la tua finta gioia
















CEMENTO
ARMATO





A emocionante "Cemento Armato" é uma das provas mais cabais de como o Rock Progressivo pode ser incrível. Sua riqueza melódica é traduzida na real demonstração de habilidades dos três músicos em seu longo interlúdio instrumental, mas, que de forma harmônica, existe para enriquecer a composição. Clássica!





A
letra põe um olhar pessimista na vida da cidade:





La
casa è lontana, gli amici di ieri


È
tutto svanito, non li ricordo più


Cemento
armato la grande città


Senti
la vita che se ne va













SGUARDO
VERSO IL CIELO





"Sguardo Verso Il Cielo" possui um certo quê do primeiro disco do King Crimson e foi uma faixa amplamente influente para o Prog italiano, afinal, ela mantém a estrutura da música clássica: compacidade do som e preciosidade nos arranjos.





A
letra pode ser inferida como uma reflexão sobre esperança:





La
maschera di un clown in mezzo a un gran deserto


un
fuoco che si spegne, uno sguardo verso il cielo


uno
sguardo verso il cielo, dove il sole è meraviglia


dove
il nulla si fa mondo, dove brilla la tua luce





Sguardo
verso il cielo” foi lançada como single e fez algum barulho dentro
das paradas italianas, graças, em boa parte, à divulgação pela
rádio RAI.













EVASIONE
TOTALE






Evasione
Totale” é uma canção bem experimental, apontando para aquilo que
a banda faria nos anos subsequentes: esferas psicodélicas muito bem
reproduzidas e total domínio durante as passagens instrumentais,
especialmente aquelas guiadas pelo Moog.






A
letra brinca com luz e trevas:





Non
finirà il mio viaggio con te


non
finirà io lo sento, è già tardi


e
la realtà fuggita


e
sempre il buio vedrò













IMMAGINI





"Immagini" aposta na suavidade e em uma abordagem mais introspectiva. A canção se revela um convite à imaginação do ouvinte a desenvolver as imagens descritas pela letra recitada por Tagliapietra.





A
letra apresenta um local bucólico:





Un
ruscello sulla luna,


Un
giardino in mezzo al sole,


Un
cipresso nel deserto,


tutti
i prati color viola


E
lei non c'è


lei
non c'è














MORTE
DI UN FIORE





A sétima - e última - faixa de Collage é "Morte di un Fiore". O álbum se encerra com uma música que ainda remete à fase anterior do Le Orme, ou seja, há reminiscências do Beat do disco de estreia. Mas é uma canção agradável, mesmo sem ser brilhante.





A
temática da letra é a morte:





Ti
sei fatta ritrovare


nel
mezzo di un prato


dentro
ai tuoi logori blue jeans













Considerações
Finais





Collage
é uma amostra inicial de todo o talento do Le Orme.





Embora
não tenha repercutido em termos das principais paradas de sucesso, a
norte-americana e a britânica, Collage entrou no Top 10 da parada
italiana.





O
disco, feito com a contribuição decisiva do produtor Gian Piero
Reverberi, é muito influenciado pelo Quatermass, e
convencionalmente considerado o primeiro disco de rock progressivo
italiano, sendo o precursor desse ‘novo gênero musical’ que em
muito pouco tempo aconteceu em todo o país.





O
projeto é coroado de sucesso: este é um dos álbuns que abre, para
as bandas italianas, um modo de rock com sabor internacional. Para as
partes cantadas, os efeitos eletrônicos que dão à voz um som
levemente metálico são característicos.





O
disco é caracterizado pelos sons típicos do gênero, como o uso
massivo de teclados. As faixas como “Era inverno” e “Morte di
un fiore”, respectivamente, falam de prostituição e morte
violenta (talvez por overdose) e esta se tornaria uma característica
bastante comum do grupo, ou seja, querer abordar, com suas próprias
canções, temas discutíveis, ou, na época, tabus.





François
Couture, do site AllMusic, dá ao trabalho uma nota 3 (em 5),
atestando: “(…) É também o primeiro álbum a apresentar o som
de rock progressivo do trio, embora em um estágio embrionário. Como
tal, é um pacote misto. Por um lado, você obtém pomposos
exercícios excessivos de teclados que devem muito ao Nice
(“Collage”, “Sguardo Verso Il Cielo”), e até arranjos
orquestrais. Por outro lado, você também recebe músicas como “Era
Inverno” e “Morte di un Fiore”, ambas músicas prog italianas
típicas (com violão), anunciando o que será o som clássico do Le
Orme
”.





Acidamente,
Couture conclui: “Se Collage representa um grande passo em
relação a Ad Gloriam (estréia do Le Orme em 1969),
não é nada comparado ao que Uomo di Pezza (1972)
representará em termos de evolução. Ainda assim, Collage
produziu dois cortes clássicos ("Sguardo Verso Il Cielo" e
a faixa-título)”.





Em
2015, a BTF republicou o disco em uma edição limitada em vinil
transparente com as mesmas capa e encarte da edição original. O
álbum deu seu nome ao grupo musical da Sardenha, Collage.





Um
novo disco de estúdio viria já em 1972, com o antológico Uomo
di pezza
.













Formação:


Tony
Pagliuca - Teclados


Aldo
Tagliapietra - Vocal, Baixo, Guitarra


Michi
Dei Rossi - Bateria, Percussão





Faixas:


01.
Collage (Pagliuca/Tagliapietra/Reverberi) - 4:49


02.
Era inverno (Pagliuca/Tagliapietra/Reverberi) - 5:05


03.
Cemento armato (Pagliuca/Tagliapietra/Reverberi) - 7:13


04.
Sguardo verso il cielo (Pagliuca/Tagliapietra/Reverberi) - 4:19


05.
Evasione totale (Pagliuca/Tagliapietra/Reverberi) - 7:01


06.
Immagini (Pagliuca/Tagliapietra/Reverberi) - 3:03


07.
Morte di un fiore (Pagliuca/Tagliapietra/Reverberi) - 3:05





Letras:


Para
o conteúdo completo das letras, recomenda-se o acesso a:
https://www.letras.mus.br/le-orme/





Opinião
do Blog:





Finalmente
o RAC traz para suas páginas o famoso Rock
Progressivo Italiano
, com uma de suas bandas seminais: Le
Orme
.







Composta
por músicos de qualidade insofismável, é praticamente impossível
traçar um destaque individual na banda, pois todo o trio desempenha
um papel formidável durante a obra. Ainda assim, o Blog se permite
apontar Tony Pagliuca como um ponto mais alto, pois muitas vezes é o
tecladista quem guia os caminhos por onde o grupo desenvolve suas
canções.







Collage
apresenta a sonoridade ‘Prog’ que o Le Orme consagraria,
mas ainda em desenvolvimento. As habilidades musicais de seus
componentes estão lá, nitidamente, e são elas quem fornecem esta
fusão de sonoridades, com clara abordagem sinfônica, mudanças de
andamentos, belos arranjos e um indiscutível toque mediterrâneo.







As
intensas passagens instrumentais e o Moog de Pagliuca são elementos
distintivos do disco e um ponto a que o ouvinte precisa de se
atentar.







Outro
componente importante do trabalho são suas letras, avançadas para a
sociedade italiana da época (muito religiosa), com textos que fogem
da simplicidade. Valem uma conferida.







Entre
as preferidas do RAC estão “Collage”,
“Cemento Armato” e o clássico Sguardo Verso il Cielo”.







Enfim,
Collage é uma obra de vanguarda para o Rock Italiano, sendo
muito influente em seu país de origem e de qualidade inquestionável.
Uma boa amostra da categoria do Le Orme, e uma introdução
para um conjunto extremamente acima da média. Disco muito bem
recomendado pelo Blog!


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